terça-feira, junho 07, 2016

um dia de merda em 2038

Eu vim aqui reclamar da porra do Fred que vem ganhado de mim todas as manhãs. Não aguento mais. Não quero mais ele. Perder no jogo era uma das poucas coisas que eu pedia pra ele fazer. Escovar meus dentes, coçar minhas costas, limpar a roupa quando estivesse azedando e perder no pedra, papel e tesoura. É uma mania boba, eu sei, querer jogar pedra, papel e tesoura toda manhã. Mas fica na tua, não me critica. Quanta a gente ai com mania de foder com galinhas, entortar garfinhos ou cheirar o próprio peido com orgulho? Cada um com a sua mania. O Fred quer me destruir. Isso é um aviso, um aviso para humanidade ou pra sei lá que porra. É um aviso. O Fred quer me destruir. Eu coloco pedra. Ele papel. Eu coloco tesoura. Ele pedra. Fred, seu tamanduá cibernético, não foi esse o programado! Sai de casa puto pra caralho. Perdi a merda do ônibus. Ativei o turbo, corri uns quinhentos metros e o motorista viu. Ele viu! Foi embora mesmo assim, vendo que eu tava com a bateria esgotando. Fred, seu bosta, te falta compaixão. Porque uma coisa é acordar e ganhar uma partida de pedra, papel e tesoura. A outra coisa é perder! Eu quero devolver o Fred! Foi isso que eu vim dizer. Tropecei da merda do ônibus quando sai. Ralei a merda toda. Três adolescentes olharam pra mim com cara de nojo. Xinguei eles e um deles chutou meu olho biônico para longe. Foi quando eu percebi que ele tinha caído. Minha mãe fica economizando e comprando esses olhos biônicos vagabundos, depois gasta muito dinheiro tentando consertar aquele cabelo amanteigado dela. Fui atrás dos meus olhos, o chip tava bambo e eu tomei dois choques até conseguir encaixar de novo. Minha mãe podia ter me devolvido, se é pra pegar e criar dessa forma, melhor nem ter. Enfim. Não tem como um dia ser bom depois disso. Fred, vai se foder legal. Do outro lado da calçada uma velha humana tropeça no meu olho cibértico e rola calçada abaixo, soltando seu pug, que sai correndo, enquanto ela grita “Miudin!” até encontrar a senhora morte lá embaixo. Hehueheuheuheu. Velha escrota. Fiquei sem olho. Andei até o trabalho. Na porta, o aviso de “Greve”. Chutei o portão, danificando meu dedo. Aqueles masturbadores de merda, nem pra me avisar no whatsapp. Nesse momento, eu coloco a mão no bolso e percebo que Puta que o pariu!!!111!!1! A Sara não! Roubaram a Sara! Moleques! Não vai adiantar nada, Sara só responde a minha voz. Sara, onde quer que você esteja, saiba que eu te amo e vou em breve te recuperar, bichinha. Masturbadores de merda, quem decide uma greve antes do meio-dia e não avisa? Eu poderia não ter acordado, não ter jogado pedra, papel e tesoura com aquele robô do infernos. Não ter corrido atrás de um ônibus que descoordenou meu marcapasso. Ou terá sido o roubo de Sara? Meu Deus! Que inferno! A única coisa que eu gostava na minha vida era ouvir a voz de Sara de manhã falando “Bom dia, chefe! Quem vai ganhar três partidas seguidas do Fred?”. Fred, era um pacto, você desrespeitou. Eu te programei para perder, Fred. Menu opções: perder fingindo que foi por pouco. Tentei te injetar um pouco de nobreza, seu robô miserável, não tem pena de ninguém. Acha que vai conseguir o que com isso? Dominar a humanidade? Me poupe desses seus sonhos cafonas, Fred. Me poupe. A vida é um buraco mais embaixo do que isso ai que você tá romantizando. Você devia ser mais obediente, seu latão demente. Obediente como a Sara. Mi amor, Sarita! Mi sonido de todas manañas! To puto pra caralho. Vou desligar o merda do Fred e hibernar pela próxima primavera que nem os ursos faziam. Esses sim eram inteligentes.

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