sexta-feira, julho 18, 2014

crise dos 45.

foi quando um passageiro no meio do voo noturno acordou
ouviu um barulho estranho e lembrou do medo que já tinha tido
antes de parar de ter, depois que se acostumou com sua movimentada
rotina. olhou logo para a passageira do lado que dormia profundamente
e sentiu falta dos sonos profundos. Não conseguia dormir bem desde dos
dezesseis anos, quando roubou um walkman da loja de departamento do
shopping perto do colégio. Sonhava que seria preso, torturado, esconjurado, 
vaiado, abandonado, escorraçado. mas, sem dúvidas, essa é outra história.
O barulho se juntou ao chacoalhar cada vez mais incômodo que se dava 
no avião.Não tardou para as luzes de emergência acenderem com o aviso
de "coloque o cinto". Tinha medo do fim. Morrer daquela forma sem levar ninguém
querido junto. Morrer sozinho, levar a mãe às lágrimas, o filho ao abandono, ser 
esquecido, o mundo que sempre insiste em continuar. Com ou sem ele.
Spielberg, Mozart, Napoleão. Homens que ficariam para história. E o Mozart
que morreu tão cedo, tão mais novo que ele. Filho da puta. Filho da puta do Mozart.
Estava suado. As mãos tremiam. A aeromoça, disfarçando o pânico, o ajudou com
o cinto e o lembrou como eram as instruções da máscara de oxigênio.
A outra aeromoça, de cabelos vermelhos, bebia um gole de champanhe. Nessas
horas deviam distribuir champanhe de graça a todos os passageiros à bordo.
Aviso do piloto. Zona turbulenta. Luzes que piscam. Passageira do lado que acorda e 
logo começa a rezar. Lembra que quando as coisas chegam nesse ponto em
filme americano é que em boa coisa não vai resultar. Dali pra frente é só
desespero. Crianças que choram. Quando tinha medo de avião costumava 
confiar que avião com bastante criança tinha menos chance de cair. Caso 
existisse algum tipo de Deus (Deuses) regendo o Universo. Rezava junto com sua 
nova amiga, cúmplice, confidente, a passageira do lado que continha no canto da
boca aquela baba branca que sobra dos sonos profundos. Ficou com nojo e meio 
puto com a falta de sutileza dos acontecimentos últimos de sua vida.
O velho cardíaco que teve convulsão, a criança chorando, dois homens se 
batendo e batendo boca, mulheres desesperadas. O avião parecia um corpo de uma 
mulher. De braços abertos. Uma mulher apaixonante que driblava o ar
quando passava. Sólida e imponente. Complexa e confusa. Gritava internamente.
Uma mulher correta, persistente, firme e frágil.Tão frágil que não resistia
à um simples defeito no motor principal. Coisa que só saberiam depois
de achar a caixa preta. Latinhas de coca-cola rolavam pelo chão. Pegou uma bebeu
entre a reza do Pai Nosso. Pai nosso. Abre a Latinha. que estais no céu, santificado.
Primeiro gole. Seja o Vosso nome. Seja feita. Dá alguns goles e continua a reza 
pelos pensamentos. Perdoai as nossas ofensas. Assim como nos perdoamos 
a quem nos tem. Arrota. Ofendido. Não nos deixeis cair. As máscaras de oxigênio caem.
Os gritos histéricos não fazem mais efeito. Se mantem sentado. Em tentação.
Os gritos histéricos não fazem mais efeito. Se mantem sentado. Em tentação.
Mas livrai-nos. Os últimos segundos. A respiração ofegante que chupa todo o oxigênio
possível, como se aquele O2 fosse salvá-lo do mal. Amém. Os últimos segundos
dentro do corpo de uma mulher. Chacoalhava dentro do corpo de uma mulher,
enquanto a coca cola descia em sua garganta. Ocupava sua laringe ou faringe. 
Os últimos segundos. E quando estava bem perto de gozar



https://www.youtube.com/watch?v=nPbxIT9W1AY

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