segunda-feira, junho 30, 2014

Abrigo.

Resolveu sair de lá. Sem saber muito bem pra onde. Pensou bem no que levar e no espaço que sobrou na mochila jeans surrada jogou o que cabia ainda do antigo mundo. Talvez fosse, em algum momento, sentir falta de alguma coisa. Do gosto do salame ou do jogo do flamengo. Mas não agora. Agora era ela, pra valer e mais nada. Já era bastante coisa, embora valesse menos que um cavalo premiado, a cotação do dólar ou uma mega sena acumulada. Foi.  Sem saber muito bem pra onde. Aproveitou os últimos instantes em que participava daquele movimento de segundo, minuto, hora, dia, fôlego, obra, leito. O tempo, e toda sua majestade, disputava com ela certo poder. Decidiu que não seria mais mera participante. Os segundos nunca mais passariam iguais. Pensou em desistir. Se jogar debaixo da cama e ficar até os medos passarem. Era mais fácil quando era criança. Tá. Talvez não fosse. Mas passou e ela sobreviveu e bem. Colecionou discos, não teve cáries, conquistou bons amigos e já sabia diferenciar vinhos. Pensando assim talvez ainda tenha como ficar..  Foi-se. Sem saber muito bem pra onde. Molhou os dedos com a saliva e seguiu o vento e seguiu voando. Venceu o medo e largou o pé dessa terra. foi embora e talvez pra sempre e quem quisesse que a acompanhasse. Não agora. Agora, só precisava da solidão. Na solidão retornaria a imensidão que perdeu em algum canto de si. Precisava de quilômetros de si, só. Precisava ficar mais próxima do que realmente importa. Por alguns meses viraria só expectadora, só um olho a mais pras lembranças se fazerem, intensa espiã de toda aquela zona. Só uma fiel observadora da obra divina que era a vida, que era ela vestida de azul, que era o mar e toda imensidão, que era tudo agora tão calmo. Só.  Foi pra lá, nem avisou a vó, nem a tia. Foi tentar entender a coisa toda, pra amar em campos grandes, pra abrir a percepção, pra voltar a apaixonar-se por detalhes e milagres. Só distanciou-se pra ver melhor, abrir olho e encarar aquela orquestra esquizofrênica que era o mundo, em paz. e chegou lá. Lá, sem saber muito bem onde . e entendeu mais um pouco de tudo. Quanto mais longe ia, mais se enchia de toda aquela vida que ficava pra trás. E subiu ao topo, conquistou seu espaço. Foi para a Lua. Sim, a esfera enorme e branca que nunca a desabrigaria.

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